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Eixos temáticos

1. O comum como política do conhecimento: produção de dados e conhecimentos abertos
2. O comum urbano: práticas e experiências espaciais

3. O comum na América Latina: apropriações teórico-metodológicas

4. Cooperativismo, autogestão e o comum: aproximações e distanciamentos

5. Comuns urbanos e poder público em tempos ameaçadores

6. Natureza e comum como racionalidade para produção do espaço urbano e dos modos de vida

1. 

O comum como política do conhecimento: produção de dados e conhecimentos abertos 

Palavras-chave

Peer-to-peer; Produção Peer; Governança peer; Inteligência coletiva; Comum digital; Cultura livre; Software livre; Experimentação social; Produção cultural; Mapeamento colaborativo; Orçamento participativo

Este eixo coloca em perspectiva o comum na construção do conhecimento, compreendendo a multiplicidade de abordagens políticas sobre a gestão comunitária de informações e recursos culturais, que vão desde costumes ancestrais, desenvolvimento de culturas de compartilhamento de dados, disseminação de iniciativas de inovação social para arranjos criativos de experimentação na criação de plataformas colaborativas e laboratórios cidadãos. 

Pretendemos reunir discussões em torno da produção de conhecimentos como bem comum, considerando a pluralidade de métodos e técnicas apreendidas por práticas informacionais construídas e compartilhadas em comunidade e que podem ser utilizadas em pesquisas, ações e experimentações.

As discussões acerca do comum na construção do conhecimento evidenciam a crítica à propriedade intelectual e à privatização de informações. Sob este ângulo, o conhecimento é tomado como elemento emancipatório para a liberdade de expressão e para as práticas democráticas que surgem da produção de dados e de conhecimento aberto, dos movimentos de cultura livre, creative commons entre outros.

Diante do cenário da pandemia (COVID-19) vimos crescer o número de práticas e ativismos digitais e a diversificação de suas modalidades. Estas ações estão relacionadas a mapeamentos colaborativos, plataformas cidadãs e redes de grupos de solidariedade com o objetivo de enfrentamento das mais diversas dificuldades.  Este conjunto de iniciativas coloca a sociedade como parte de uma grande rede de apoio, cultivando o comum na construção do conhecimento. 

Algumas temáticas se inserem nas abordagens para este eixo, como as pesquisas sujeito-sujeito, os estudos etnográficos;  questões relacionadas à arquitetura peer-to-peer de redes, à inteligência coletiva; mapeamentos colaborativos, softwares livres e alternativas informacionais, abertura de dados para fins de transparência e gestão compartilhada; experimentação social e produção cultural, cultura livre e cultura maker.

2.

O comum urbano: práticas e experiências espaciais

Palavras-chave

Práticas insurgentes; Espaço urbano; Cartografia; Arquitetura; Espaço público; Território; Experiência urbana; Prática local; Lugar; Comunalidade


Este eixo se relaciona aos desafios intrínsecos ao comum urbano, que incluem tanto as formas de gestão compartilhada, quanto o próprio processo de constituição daquilo que se nomeia comunidade. Ambas as condições se desenvolvem por meio de temporalidades, que incluem a agência das coisas e das pessoas; a gestão da ideia, do lugar e da manutenção; a proposição, execução e programação. Trata-se de processos que não preexistem, mas que são estabelecidos por meio da experiência.

Pretendemos discutir as experiências que se aproximam da noção de comum urbano, as intervenções que partam de agenciamentos locais para a construção socioespacial e do interesse coletivo na vivência cotidiana, nas muitas formas em que ocorrem.

As relações pertinentes ao comum urbano oferecem formas de dialogar com o preexistente, com as experiências de comunalidade da vida, com as características de colaboração, solidariedade e reunião de saberes interdisciplinares. Criam um espaço de discussão autônomo e não-institucional, alteram e ampliam a agenda de luta pelo direito à cidade, colocando em perspectiva o espaço habitado, produzido e vivido. Também dizem respeito aos agentes envolvidos na produção da cidade, que empregam formas não hegemônicas de organização, estruturadas de acordo com os conceitos de horizontalidade, não-hierarquia, urbanismo em rede, de democracia radical ou governança dos comuns. Este conjunto de relações e práticas constituem formas de reivindicar o mundo contra as privatizações e cercamentos – implicações urbanas geradas pela lógica neoliberal –, que priorizam a individualidade. 

A pandemia (COVID-19) e seu impacto acentuado nas periferias de cidades brasileiras reafirma a denúncia de um território desigual. Ao mesmo tempo, em resposta às urgências latentes, podem ser observadas formas de agenciamentos espaciais e experiências relevantes às discussões apresentadas aqui. Neste caso, o desenvolvimento de espacialidades distintas daquelas previstas pela lei e pelas práticas tradicionais, permitem o entendimento da cidade como plataforma aberta.

São bem-vindas reflexões acerca da experimentação comunitária e estético-política, que operem dentro das fissuras do sistema capitalista, criando condições para seu desmonte, visando uma alternativa emancipatória. Adicionalmente, interessa debater os meios com que a arquitetura possa contribuir e fomentar a instituição de práticas do comum. Buscamos reflexões, leituras, cartografias, práticas, casos, experiências que investiguem a questão desde suas mais variadas perspectivas, com base nos recursos e condições oferecidas pela realidade das cidades Latino Americanas. 

3.

O comum na América Latina: apropriações teórico-metodológicas

Palavras-chave

América Latina; Teorias decoloniais; Comuns latino-americanos; Bem-viver


Este eixo se vincula às formas de abordagens do comum desde as perspectivas e fundamentações propostas por epistemologias latino-americanas. Envolvem pesquisas que se dedicam às especificidades das práticas e reflexões que possam ser identificadas como comuns no continente latino-americano, à análise sobre os seus desdobramentos (continuidades, rupturas, aproximações e distanciamentos), ao mapeamento de coletivos, comunidades e grupos responsáveis pela instituição dos comuns e seus processos de gestão coletiva, uso compartilhado e de produção do espaço latino-americano – compreendido na sua dimensão de um território em disputa.

Buscamos fortalecer o debate e a troca de experiências que possam apontar soluções locais para os desafios da produção do espaço latino-americano. 

O contexto latino-americano tem posto em evidência as transformações e as criações próprias de seu povo em contraposição à ideia de uma assimilação passiva das epistemologias do Norte Global. A contribuição das pesquisas e abordagens que se fundamentam nas teorias decoloniais e nas epistemologias do Sul Global, como o Bem-viver e o Ubuntu, revelam a construção de novos valores e o tensionamento sobre a representação e a experiência  da modernidade, estabelecendo uma ampla crítica sobre os seus pressupostos, seus valores centrais e o engendramento de suas racionalidades, os desencontros históricos e as anomalias do “modo de ser moderno”.

Este conjunto de relações modificam substancialmente a perspectiva contemporânea sobre como se institui a diversidade sociocultural latino-americana, a multiplicidade e coexistência de tempos históricos, e a construção de outras cosmologias e formas de subjetividades que não sejam estritamente ocidentalizadas – ao modo das racionalidades europeia e norte-americana.

O diálogo possível entre as diversas culturas dos povos latino-americanos sugere uma abertura à valorização e trocas de saberes, à reciprocidade e solidariedade das interações, à transformação das matrizes de gerenciamento dos recursos naturais e à construção coletiva de formas de vida mais plurais, harmônicas e sustentáveis. 

Integram a este eixo o conjunto de debates e reflexões que cabem análises das experiências coletivas de grupos tradicionalmente marginalizados, tais como: comunidades indígenas, ações e resistência de grupos culturais e religiosos de tradição africana, organização de imigrantes e refugiados, comunidades periféricas, questões de identidade de gênero, sexualidade e raça, defesa dos direitos da natureza, luta por moradia, infraestrutura urbana etc.

4.

Cooperativismo, autogestão e o comum: aproximações e distanciamentos

Palavras-chave

Economias alternativas; Cooperativismo, Autogestão; Termo territorial coletivo


Este eixo se relaciona aos modos de vida e às práticas socioeconômicas alternativas aos modelos econômicos hegemônicos, que de alguma maneira contribuam com o bem-estar de seus colaboradores e atendam às necessidades da coletividade. Estas relações se destacam por meio dos processos colaborativos de tomada de decisões e pela divisão de bens e riquezas de forma equitativa, baseando-se nos princípios de participação democrática, solidariedade, equidade e autonomia.

Buscamos compreender e mapear um conjunto de práticas que incluem a autogestão, economias alternativas, cooperativismos, termo territorial coletivo, entre outros, e suas relações com as teorias e a instituição dos comuns. Também procuramos caracterizar as aproximações e distanciamentos entre tais práticas e os comuns urbanos, questionando se essas se constituem como uma possível forma de produção comunitária e espacial comum.

A recente sucessão de crises econômicas, políticas e ambientais descortinaram a insuficiência da democracia representativa, a degradação dos modos de vida por meio das diferentes formas de precarização, privatização e desapropriação dos recursos naturais e daqueles produzidos pela humanidade. Por outro lado, afirmou a importância da abertura de outros modos de discussão e ação mais horizontais, avançando sobre a reflexão que toma as antigas promessas promovidas pelos Estados e a relação destas com as iniciativas coletivas e civis engendradas na vida cotidiana.

As práticas cooperativistas, mesmo sem êxito em larga escala e apresentando ambiguidades nas suas experiências produtivistas, ainda demonstram o potencial das formas de organização coletiva e as suas possibilidades de integração aos bens comuns urbanos.

As realizações antissistema apresentam um conjunto de possibilidades e experimentações que criaram moedas próprias, outras formas de troca e reciprocidade, como propriedade habitacional e territorial coletiva, autoconstrução em regime de mutirão, ocupações autogestionadas, hortas e centro culturais comunitários, entre outros. 

Entretanto, devemos estar atentos às relações de cooperação e trabalho que resultam no aumento da taxa de exploração da força de trabalho por meio do trabalho não pago ou realizado nos horários de folga. Do mesmo modo, devem ser verificadas as relações estruturais e sistêmicas de trabalho, produção e comercialização informais e suas práticas socioeconômicas que permitem a continuidade do engendramento da racionalidade neoliberal.

Integram a este eixo as possibilidades de análises de experiências de auto-organização e autogestão comunitárias, economias solidárias e alternativas tais como cooperativas. Incluem também outras práticas distintas em  que as riquezas geradas e tomadas em comum são partilhadas equanimemente, onde os vínculos de cuidado são mantidos e os bens comuns não são reduzidos ao valor de troca.

5.

Comuns urbanos e poder público em tempos ameaçadores

Palavras-chave

Estado; Instituições públicas; Políticas públicas; Governança; Ação política; Comuns; Experiências do comum


Este eixo se relaciona às formas de compreensão do poder político do Estado, aos sentidos que representam a esfera pública, os horizontes da ação política e as conexões com as possibilidades de instituição dos comuns, da promoção, diversificação, pluralização, inclusão e equidade das formas de vida.

Interessam a este eixo os questionamentos teóricos e empíricos, tanto quanto as experiências vividas, em especial as formas (e formatos) de ação do Estado e os desenvolvimentos práticos de políticas públicas, com base em experiências que de alguma maneira contribuem com a instituição de comuns.

Os comuns inspiram formas colaborativas, mais horizontalizadas e de autogestão da vida, da sociedade e dos territórios que vão de encontro a interesses de dominação política e econômica. Já é clara a expansão que a pesquisa e a prática dos comuns têm adquirido contemporaneamente como base de possíveis alternativas à globalização capitalista e ao neoliberalismo. No entanto, os comuns podem representar uma ameaça  ainda mais direta à estrutura burocrática pública e ao próprio Estado moderno ao entrar em conflito com sua razão de existência enquanto locus da sistematização da política. Este quadro nos exige uma compreensão mais ampla sobre o papel da esfera pública na organização dos modos de vida e da produção-reprodução socioeconômicas.

Por outro lado, não é possível eximir-se em relação ao poder político do Estado: concentrador de recursos financeiros e institucionais e capaz de formular e implementar normas, leis, procedimentos e (medidas de) controle social. Se o Estado é alvo de disputas assimétricas localizadas temporal e espacialmente, vivemos um momento não somente de ataque à ação pública, mas também de tomada das instituições por grupos conservadores. É necessário encontrar brechas e rupturas que desmontem as políticas com ideais individualistas, objetivos de crescimento e narrativas de progresso que reproduzem sistemas de dominação e aprofundam desigualdades econômicas, de gênero, de raça e etnia, de territórios e culturas, de espécies e biomas.

Compõem este eixo as pesquisas que questionam as possibilidades de coexistência dos comuns e do Estado e sobre quais circunstâncias e sentidos se estabelecem. Consideramos como a tomada do Estado por grupos conservadores ameaça a própria existência dos comuns ou de uma relação entre eles e o poder público; e como os comuns podem encontrar brechas e compor formas alternativas de ação pública em meio a este contexto.  Ponderações acerca de como os comuns poderiam transformar a imaginação sobre as instituições públicas existentes, utilizando do poder atualmente outorgado a elas para fomentar práticas políticas transformadoras; e as possibilidades de alterar os sistemas administrativos altamente complexos e presumidamente impessoais para que apoiem formas de governança (mais) colaborativas, também são bem vindas.

Além disso, fazem parte das discussões os apontamentos sobre como expandir os comuns para políticas mais abrangentes; quais os critérios de “universalidade” ou de “cidadania” incorporados nas suas governanças; quais  problemas de escalas enfrentados; quais os conflitos atualmente existentes para que a ação pública possa fomentar os comuns urbanos; quais os ajustes institucionais, de um lado, e da ação de grupos atuantes, por outro, necessários para que possam atuar conjuntamente; e o que se pode apreender sobre isso a partir de casos que avançaram nessa direção, como as experiências do municipalismo espanhol.

Por fim, também compõem este eixo temático as investigações sobre os casos que indicam potencialidades, dificuldades e desafios das formas de apreensão das práticas e experiências de cooperação entre comuns e o Estado.

6.

Natureza e comum como racionalidade para produção do espaço urbano e dos modos de vida

Palavras-chave

Desenvolvimento ambiental; Pluriverso; Racismo ambiental; Ecologia social


Este eixo se relaciona às questões que envolvem a construção de uma ontologia político-relacional do território que, ao se ancorarem em conhecimentos ancestrais, revelam a possibilidade de repensar o ‘desenvolvimento’ e a ‘economia’, afirmando a defesa de outros modos de vida, enquanto transições ecológicas e culturais na direção de outros mundos (o pluriuniverso). Também se refere ao escrutínio crítico das questões ambientais que atualmente ocultam e sugerem olhares em relação ao que compreendemos como natureza, exigindo novas construções epistemológicas e a abertura às perspectivas cosmológicas dos povos originários, que resguardam a memória e a sabedoria da origem e se convertem em mensagem de resistência ao projeto ‘modernizante’ do ocidente.

Pretendemos reunir reflexões teóricas articuladas a experiências comunitárias com o objetivo de mapear e caracterizar as disputas situadas nas cidades relacionadas à gestão ambiental, cuja reivindicação oriente para o simultâneo compartilhamento de outros mundos possíveis.

Observamos na escala global o esgotamento das formas produtivas que se reflete na preocupação com os efeitos desastrosos das intervenções humanas numa perspectiva de mudanças climáticas. Por outro lado, percebemos na escala local, as assimetrias e desigualdades sócio-espaciais que deflagram o racismo ambiental e a fragilidade dos modelos de desenvolvimento pautados na exploração ambiental, geração de resíduos, formas extrativistas de ocupação territorial, na despossessão e desterritorialização de grupos e populações.

Esse conjunto de fenômenos socioeconômicos e socioambientais alicerçados nos processos de colonização, encontram, por outro lado, na mobilização dos povos originários, indígenas, campesinos e afrodescendentes, que aproximam diferentes países da América Latina, como Equador, Peru, Colômbia e Brasil, alternativas de gestão ambiental que transpõem diversos discursos globais para uma ótica local, em uma chave que interliga território e cultura.

Nesse sentido, torna-se importante a construção de alternativas, em contraposição ao projeto globalizante capitalista neoliberal, sob a perspectiva que movimenta disputas no campo teórico-crítico, postulando outras epistemologias para combater o pensamento único e dicotômico da modernidade; e também a disputa no campo das ações propositivas, tentando encontrar novas formas de produzir arquiteturas e cidades, em concomitância com outras formas de sociabilidade capazes de direcionar para uma ecologia social.

Tais preocupações se reproduzem nas cidades como epicentro de processos de urbanização pouco sensíveis aos territórios e suas condicionantes, intensificando a compreensão dicotômica entre natureza e cidade. O homem, aqui destacado em sua representação colonizadora, torna-se protagonista desse processo, cuja forma de ação está amparada na observação da natureza como recurso e que desdenha da sua condição de colapso.

A partir disso, a relação entre os comuns e as cidades ganha relevância como enfrentamento do esgotamento da racionalidade de produção do espaço urbano, demasiadamente vinculadas às assimétricas distribuições espaciais.  Se em outros contextos o debate em torno desta pauta já encontra profundas articulações, aqui, na América Latina, ainda estamos sujeitos às formas colonizadoras de entendimento das nossas espacialidades, muito motivadas pelas narrativas deslocadas e anacrônicas de progresso e desenvolvimento.

São bem-vindos trabalhos que articulem reflexão teórica e experimentação prática de promoção do reencontro consciente com a natureza, com os recursos naturais, com a recuperação de saberes próprios dos povos originários enquanto processos de descolonização de conhecimentos e procedimentos mesmo que parciais, temporários, em pequena escala e de dimensão local, reagindo a múltiplas e permanentes formas de acumulação, de dominação e exclusão;

Interessam ainda experiências que contribuam para a soberania alimentar, como hortas comunitárias, e outras experiências que incorporem o equilíbrio ecológico, o controle de agrotóxicos, a proteção do solo, o uso adequado das águas, a defesa dos ecossistemas, tecnologias sociais, incluindo capacidades e recursos de produção locais; 

Do mesmo modo, integram este eixo processos e projetos de baixo impacto ambiental, tecnologias e sistemas alternativos, que contribuam para melhores condições de habitabilidade, e que atendam, por exemplo, às demandas de infraestrutura, ao saneamento básico, ao controle de inundações, à proteção de mananciais, a atenção às áreas de risco, de modo a enfrentar os principais problemas que incidem em territórios de vulnerabilidade socioambiental.

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